Ontem, assistindo vídeos maravilhosos no Cultne, muitas sensações e emoções me vieram com grande força. Os discursos de Abdias do Nascimento, uma Jurema Batista aguerrida na luta, Benedita da Silva, Desmond Tutu, todos lá. A efervescência cultural que permeou as manifestações do Movimento Negro, a presença maciça de intelectuais e artistas negros, a água boa bebida na fonte das religiões de matrizes africanas, os grandes ícones da luta.
E com que força íamos para as ruas, quantas propostas, quantos projetos, quanta dignidade nas ações. Assistir a estes vídeos (faça isto!!) me fez reviver a emoção daqueles que considero os anos de reformulação e reafirmação do Movimento Negro no Brasil.
Quantas conquistas após tanto trabalho!! Quanta informação histórica cabe num único discurso de apenas seis minutos. Estou até agora impregnada destas emoções.
A questão é que não alcançamos nossa maior meta, que é a igualdade de oportunidades. Nos anos 80, quando eu iniciei esta militancia consciente, na medida em que tive contato com estes que me encheram de conhecimentos e base, éramos mais aguerridos. A visibilidade era uma meta, mas nunca foi alvo exclusivo. Até porque, se conseguirmos atinjir o alvo, que é a igualdade de oportunidades, a visibilidade será natural ao estarmos contextualizados numa sociedade baseada em respeito mútuo, respeito pleno.
Eventos múltiplos se espalham pelo país, dando visibilidade a ações e planos estrategicamente elaborados para alcançarmos esta igualdade sonhada. A questão de gênero e etnia, que historicamente foi maquiada no Brasil pelos 'poetas' que declamaram a sensualidade das mulatas escondidas em suas áreas de serviço e brilhando no carnaval, hoje é abordada amplamente, e muitas mulheres negras hoje demonstram e apontam o erro através de suas aptidões profissionais e culturais, reafirmando-se negras e livres de rótulos. Exigindo respeito. Mostrando na prática que não estamos pra brincadeira.
Particularmente, não aguento mais ser confundida com a moça que serve café em meu espaço profissional ou quando atuo em palestras, entrevistas ou algo do gênero, e não encontro mais negros e negras inseridos. E não importa como eu esteja vestida, o preço da minha bolsa ou de meus sapatos: se o 'entorno' é branco, quem serve o café no imaginário dos presentes sou eu. Sempre. Isto me cansa demais. A moça que serve café não deve ter a cor da pele como crachá.
Uso um exemplo muito pessoal para apenas para pontuar que ainda estamos engatinhando em busca da igualdade. Minhas conquistas pessoais são mérito meu, muito meu. Minha militancia me custou caro a vida toda, mas ela é parte do meu eu. E, definitivamente, jamais abrirei mão dela.
Conclamo a todas e todos a uma reflexão profunda sobre nossos atos diários, que é o espaço onde processamos as mudanças necessárias possíveis. Quem voce reconhece como agente transformador, quem é o verdadeiro propositor, quem está tentando mudar este estado de coisas? A quem voce legitima? O que está acontecendo no seu bairro, na sua cidade, para REALMENTE construir esta igualdade de oportunidades? Quantos negros e negras são gerentes de banco, vendedores de boutiques caras, vereadores, médicos, dentistas, artistas, prefeitos, profissionais liberais em sua cidade? E quantos são ambulantes, desempregados, diaristas ou servem café? E voce está fazendo o que para alterar esta realidade? E aqueles que ocupam os espaços onde estas mudanças devem ser processadas, estão trabalhando para isto? E como voce pode auxiliar neste processo?
Continuarei por aqui divulgando estas boas ações, os eventos onde os saberes se multiplicam, os nomes que fazem a diferença. Continuarei atuando na militancia comunitária, espaço onde muitos negros e negras ainda nem sabem que o são. Onde as necessidades são maiores, e apenas solucionando-as ou amenizando-as me sobre tempo para indicar a eles os fatores geradores destas dificuldades. A mim, honestamente, me basta. E me alegra o coração ver que não estou sozinha. Muitas formiguinhas, como eu, estão na luta. Ainda vamos chegar lá. Ainda que eu não veja, ainda que meus filhos não vejam, mas que esta igualdade chegue de fato!
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